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Vamos falar baleiês?

http://www.baleiafranca.org.br/abaleia/abaleia_fotoidentificacao.htm

O inverno está chegando e com ele virão nossos visitantes mais ilustres: as baleias-francas (Eubalaena australis). Esses cetáceos realizam todos os anos uma migração da Antártida, onde permanecem durante o verão e outono para se alimentarem, até o sul/sudeste do Brasil, e outros grupos até a costa da Argentina, para reprodução.

Mas vamos por partes, você sabe quem são as baleias? Quais as diferenças delas para os golfinhos? Golfinho é mesma coisa que boto? E toninha? Orca é baleia? E tubarão-baleia, é tubarão ou é baleia?

Baleias, golfinhos, botos, toninhas e orcas são mamíferos aquáticos classificados como Cetacea, ou seja, todos possuem um ancestral comum, que habitava o ambiente terrestre, e ao longo de milhões de anos passou a habitar o ambiente aquático, e isso aconteceu há aproximadamente 50 milhões de anos. E como biólogo gosta de classificar tudo, esses animais ainda são divididos em dois grupos:
Baleia-jubarte (Megaptera novaeangliae)

Mysticeti: são as baleias verdadeiras, que possuem cerdas bucais (barbatanas, que não são aquelas dos tubarões) feitas de queratina, e se alimentam filtrando os organismos que estão na coluna da água. Neste grupo estão a baleia-azul (maior animal da atualidade), a baleia-jubarte, a baleia-minke, entre outras tantas.
Barbatana de baleia-franca
Odontoceti: são os cetáceos com dentes, eles se alimentam principalmente de peixes e lulas. Este é o grupo dos golfinhos (como os famosos nariz-de-garrafa do filme Flipper, os saltadores, rotadores), botos (rosa, cinza, da Amazônia, da tainha) e as pequenas toninhas. Também há vários outros golfinhos que são comumente chamados de baleias, como a beluga (Bailey do filme “Procurando Dory”), a orca –  a baleia assassina (do filme de mesmo nome de Dino De Laurentiis, 1977) e a cachalote (da história bíblica de Jonas).
Orca (Orcinus orca)
Toninha
Com relação às diferenças de nomes do que seria baleia e do que seria golfinho, é normal que os nomes sejam misturados, já que os povos antigos que batizaram esses animais não conheciam todos os grupos, e muito menos estavam interessados em classificá-los. Dentro dos odontocetis as diferenças na nomenclatura são maiores ainda, pois muitos desses animais vivem próximo a costa, e perseguem os mesmos cardumes de peixe que os pescadores, então, em cada localidade do Brasil, as pessoas conhecem os animais por nomes diferentes. Mas de forma geral, botos, golfinhos e toninhas são a mesma coisa, é como falar cachorro ou cão. Boto não vive só na água doce ou próximo à costa, golfinho não são só os que vivem em alto mar ou os que saltam para fora da água, e as toninhas não são somente animais parecidos com golfinhos, são, de fato, golfinhos, porém de uma espécie de tamanho pequeno (Pontoporia blainvillei). Uma curiosidade de como um animal pode ter diferentes nomes, o boto-da-tainha e o golfinho-nariz-de-garrafa são a mesma espécie (Tursiops truncatus).
Tursiops truncatus em Laguna

Tá, e o tubarão-baleia? Bom, esse é o maior tubarão existente, logo, o maior peixe da atualidade, espécie Rhincodon typus, que tem um hábito alimentar parecido com o das baleias verdadeiras, se alimentando, através de suas brânquias, de organismos em suspensão na coluna d’água, como plâncton, macro-algas, krill, e outros pequenos invertebrados.

Limites da APA da Baleia-Franca
Mas vamos voltar à baleia-franca. Como mencionado no início do texto, as baleias vêm anualmente ao litoral catarinense, para acasalamento, e no ano seguinte, para terem os filhotes (sim, a gestação delas dura cerca de um ano). É muito comum que os pesquisadores encontrem as mesmas baleias todos os anos frequentando os mesmos locais, portanto, essa região acaba sendo de suma importância para a conservação da espécie, já que é um berçário natural, e parece haver uma grande fidelidade das baleias com relação ao local de reprodução (conhecido como filopatria). Por isso, o Projeto Baleia Franca propôs a criação da Área de Proteção Ambiental da Baleia Franca, que foi concretizada em 2000. Com a criação desta APA, não só a baleia é protegida, mas ela serve como um “guarda-chuva”, ajudando a proteger outras espécies que ali vivem. Entretanto, vale ressaltar que a efetividade dessa proteção pode ser questionada. Existe um grande déficit de recursos humanos e estruturais que impedem uma fiscalização, e, consequentemente, a efetiva proteção ambiental de muitas Unidades de Conservação.

Você pode estar se perguntando como os pesquisadores sabem que as mesmas baleias vieram em diferentes anos para a nossa costa. Bom, assim como os humanos, os animais possuem marcas que os caracterizam individualmente. No caso das baleias francas, essas marcas são calosidades, ou seja, espessamentos da pele, colonizados por piolho-de-baleia (ciamídeos), que ajudam a destacar essas regiões, dando uma coloração branca ou amarela. Quando os pesquisadores avistam as baleias, tiram fotos, e através dessas marcas brancas na cabeça, eles conseguem identificar os indivíduos. Além das calosidades, também são usadas cicatrizes ou outras marcações naturais, como padrão de coloração em determinadas regiões do corpo.


Exemplo de como as calosidades auxiliam na identificação, e da fidelidade local

Os meses entre julho e outubro são um tanto frios para aproveitar a praia, mas se você estiver no litoral sul catarinense, um bom programa para a família é ir até a orla, talvez procurar um local elevado, e ter a oportunidade de observar aquele esguicho em forma de V que as baleias francas soltam ao respirar, ou uma mãe nadando tranquilamente ao lado de seu filhote, quem sabe o bater das nadadeiras ou da cauda, e, se der sorte, alguns saltos. Mas caso queira acompanhar de casa, o Projeto Baleia Franca oferece uma ferramenta: o mapa de avistagem, onde você poderá saber onde os pesquisadores avistaram as baleias esse ano, e quantas estão em nosso litoral no momento.


Na Área de Proteção Ambiental da Baleia Franca é possível avistar mães com seus filhotes nadando próximos à costa
Esguicho em V da baleia-franca

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