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Antigos Relacionamentos


Texto por: Andressa Estrella, Fellipe Alborghetti e Thayza Melzer


    Como podemos saber se dois seres faziam parte de uma mesma relação ecológica no passado? Atualmente, na natureza, é possível estabelecer tais relações a partir da observação direta, sabemos que os organismos que vivem em um mesmo ecossistema podem interagir entre si e que o nível dessa interação pode ser variado. Porém, se tratando de paleoecologia, no caso desse texto mais especificamente do Período Triássico (251-199 milhões de anos atrás), ela trabalha mais com inferências do que com informações diretas e as hipóteses de relações ecológicas são analisadas a partir de analogias com comunidades atuais.
  Para determinar padrões de relações ecológicas entre dois organismos é fundamental conhecer outros elementos, como plantas e demais organismos, além do ambiente e do clima da época. Uma importante ferramenta para isso é a tafonomia. A tafonomia é o estudo de como se forma um fóssil, e pode ser utilizada para fazer deduções sobre a comunidade dos organismos fósseis. Outra ferramenta importante, que pode ajudar a inferir onde um organismo viveu, são os icnofósseis, que são marcas ou vestígios, como por exemplo, pegadas.
    É a partir dessas técnicas que é possível estudar as interações ecológicas como, por exemplo, a relação de predação entre o dicinodonte Jachaleria candelariensis e arcossauros. Foram encontradas marcas de predação, uma série de perfurações, em uma escápula desse dicinodonte (Fig. 1), e coincidentemente na mesma localidade foram achados dentes isolados de arcossauros compatíveis com as marcas em questão.
 Figura 1: A - Escápula do dicinodonte Jachaleria candelariensis, evidenciando marcas de predação. Escala= 6 cm. B - Detalhe da escápula. Escala = 6 cm (figura do livro Vertebrados fósseis de Santa Maria e região, de Átila Augusto Stock da Rosa).

    Uma outra forma de predação é a herbivoria. Uma das maneiras de verificar se um animal era herbívoro é através dos dentes e da mandíbula fossilizados. Os rincossauros viveram no Triássico e apresentavam adaptações diretamente vinculadas ao hábito herbívoro com uma dentição composta por um conjunto de placas formadas por dentes pequenos (Fig. 2). Essa característica, juntamente com a morfologia da mandíbula e da maxila, sugere que estes animais tinham uma mordida forte e possivelmente adaptada a quebrar sementes e frutos.
    Depósitos triássicos situados na região de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, mostraram o registro de ossos que apresentam perfurações cilíndricas semelhantes às de insetos necrófagos, que se alimentam de carcaças de animais em decomposição. Tais perfurações estabelece a interação inseto-vertebrado em comunidades terrestres nesse período e reforça as hipóteses que sugerem que algumas carcaças poderiam ficar expostas por um período relativamente longo antes do soterramento, permitindo a ação de detritívoros e decompositores.
    Embora pareça simples, a tarefa de compreender as interações entre os organismos extintos é dificultada pela escassez do registro fóssil, que preservou apenas uma pequena parcela da biodiversidade existente no passado. Mas a partir dessas ferramentas, paleontólogos pelo mundo todo tentam responder as perguntas sobre os hábitos de vida dos organismos do passado e como eles se relacionavam entre si.

Figura 2: Crânio de rincossauro, aproximadamente 35 cm (figura do livro Tetrápodes Triássicos do Rio Grande do Sul, Brasil, de Cesar Leandro Schultz).


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